Soneto Ora direis ouvir estrelas (Via Láctea), de Olavo Bilac

Ora direis ouvir estrelas na íntegra

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...

E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: "Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?"

E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas. 


Análise

Ora (direis) ouvir estrelas é o soneto número XIII da coletânea de sonetos Via Láctea. No livro Poesias, Via Láctea se encontra entre Panóplias e Sarças de fogo.

Diz-se que o tema do amor, mote inspirador dos versos de Bilac, foi fruto da paixão que o poeta teve pela poetisa Amélia de Oliveira (1868-1945), irmã de Alberto de Oliveira (1857-1937).

Os versos apaixonados transparecem o afeto de um recém apaixonado que dialoga com as estrelas. Quem o ouve acusa o eu-lírico de devaneio:

         Ora (direis) ouvir estrelas! Certo perdeste o senso!”

O eu-lírico não liga para a acusação e ainda sublinha a sua necessidade de conversar com as estrelas deixando, inclusive, as janelas abertas para melhor ouvi-las. A conversa com os astros é longa, se estende noite adentro:


         E conversamos toda a noite, enquanto
         A via-láctea, como um pálio aberto,
         Cintila.

A tristeza aparece quando nasce o sol e torna-se impossível vê-las. O apaixonado então recolhe-se a sua tristeza e agonia a espera que a noite caia novamente.

A meio do poema são inseridas aspas para indicar a presença do interlocutor, que o acusa novamente de se desconectar da realidade para conversar com as estrelas. O eu-lírico então devolve uma resposta cabal:


          E eu vos direi: "Amai para entendê-las!
          Pois só quem ama pode ter ouvido
          Capaz de ouvir e de entender estrelas.

Ao mesmo tempo que fala de um sentimento particular - o encantamento provocado pela amada, o sentimento de enamoramento - o poema é construído de modo universal, de forma a alcançar os ouvidos de qualquer pessoa que já tenha se sentido em tal estado.

Trata-se, por isso, de versos eternos, que não perdem a validade, porque retratam sentimentos tipicamente humanos e genuínos, independentes de qualquer tempo e lugar.

A amada aludida nos versos de Ora (direis) ouvir estrelas não é nomeada, nem sequer conhecemos qualquer característica física sua.

O amor cantado pelo poeta recebe heranças da contenção neoclássica, uma oposição ao sentimentalismo derramado romântico de outrora.

Em termos formais, Bilac como representante típico do Parnasianismo segue um rigor formal e estilístico. A rima, por sua vez, está presente em Via Láctea.

Rebeca Fuks
Doutora em Estudos da Cultura

 Fonte: Cultura Genial

Poesia declamada


 

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